Museu Nacional, o risco de a memória virar cinzas

Dizem que a primeira lavagem de dinheiro no Brasil aconteceu logo após o descobrimento. Segundo historiadores, o navegante português Diogo Alvarez trouxe um tesouro escondido em sua caravela. E para reivindicar a posse das joias inventou que o índio Muribeca, irmão de sua mulher, é quem lhe oferecia pedras lapidadas e requintados lavores em ouro.

Mais tarde, em 1808, o rei Dom João Sexto, fugindo de Napoleão, tomou um casarão de um traficante de escravos e fez lá sua suntuosa residência. O rei depositou nesse local suas coleções de arte e ciência. O rei também trouxe de Portugal muitos funcionários da corte, ricos comerciantes e juízes.

Com o passar dos anos, as coleções do rei foram enriquecidas e o acervo se transformou num inigualável museu. Mas agora tudo isso virou cinzas: nosso ancestral mais antigo, a lei que aboliu a escravatura; o maior dinossauro brasileiro, tudo se foi.

A negligência, a ganância e a corrupção sempre se interpuseram entre os brasileiros e o seu destino – e no incêndio do Museu Nacional não foi diferente. O casarão estava um caco, não havia extintores, os detectores de fumaça não funcionaram e a água nos hidrantes foi insuficiente. Contudo, uma semana antes dessa tragédia o poder judiciário reajustou seus gordos salários em mais de 16%

De certa forma, a morte anunciada do Museu Nacional é semelhante ao rompimento da barragem de Mariana, não acham? Novecentos quilômetros de rios, 35 cidades e 320 mil pessoas foram devastados pelo descaso, a avidez e a incompetência. Mas a Samarco continua aí, faturando. E ainda se nega a pagar o prejuízo que causou ao país.

No Brasil, desde o descobrimento, é sempre assim: mudam os vultos históricos, mas a lama continua a mesma.